Uma
das imagens mais lindas, carregadas de sentido humano e cristão é a da
gravidez. Encanta-me encontrar, como acontece com frequência no ambiente
amazônico em que vivo, casais que pedem a bênção para a esposa que se
aproxima do parto da criança, acolhida como dom de Deus. É a festa da
vida e da esperança, a teimosia positiva de pessoas que acreditam que
filho não é trabalho, mas bênção de Deus. De fato, "os filhos são
herança do Senhor, é graça sua o fruto do ventre. Como flechas na mão de
um guerreiro são os filhos gerados na juventude. Feliz o homem que tem
uma aljava cheia deles" (Sl 127, 3-5).
A Igreja no tempo do Advento se assemelha a esta linda imagem humana,
pois está grávida da graça e da presença salvadora de seu Senhor. Aquele
que um dia voltará, e certa como a aurora é a sua vinda (Cf. Os 6,3),
vem a nós de novo. "A Igreja deseja ainda ardentemente fazer-nos
compreender que o Cristo, assim como veio uma só vez a este mundo,
revestido da nossa carne, também está disposto a vir de novo, a qualquer
momento, para habitar espiritualmente em nossos corações com a profusão
de suas graças, se não opusermos resistência" (Cf. Cartas Pastorais de
São Carlos Borromeu, bispo - Acta Eclesiae Mediolanensis, t. 2, Lugduni,
1683, 916-917). O "estado de gravidez" da Igreja em tempo de Advento
traz consigo consequências para a vida dos cristãos, que queremos chamar
de "Virtudes do Advento", como proposta para as pessoas e as
comunidades.
O ponto de partida é a necessidade profunda do Redentor. Não
somos capazes de nos redimir por nós mesmos e de oferecer um sentido
profundo à existência. Há uma iniciativa gratuita de Deus, que vem ao
encontro da humanidade (Cf. Juan Ordoñez Marques, Teologia y
Espiritualidad del Año liturgico, pág. 213, BAC, Madrid, 1978). Nossa
boa vontade humana é insuficiente! Carecemos de Deus, de sua presença e
de seu amor salvador! Uma humanidade sem Cristo é decadente, escorrega
para o vazio absoluto. Deus preparou seu povo, através de gerações de
homens e mulheres, dentre os quais se destacam os que, considerados
pequeno resto dos pobres de Israel, permaneceram fiéis à promessas
antigas. Também hoje, diante das promessas de Deus, que é fiel,
multiplicam-se os que não duvidam de sua palavra.
A esperançaé a virtude própria dessa gente, e queremos fazer
parte dela! Quem a vive toma consciência da necessidade do Cristo que
vem, abre-se para viver com fidelidade a ele e aponta a bússola de sua
vida para a eternidade, onde Deus será tudo em todos. Não espera apenas o
dia de amanhã, ou quem sabe uma visita que se anuncia e nem mesmo os
eventuais benefícios que a vida oferece, mas espera Deus e espera tudo
de Deus.
Viver a virtude da esperança leva o cristão à oração diante da
promessa de Deus. E oração cristã é feita com humildade, sinceridade,
abertura à vontade de Deus e obediência. Rezar e rezar melhor é próprio
do Tempo de Advento. A melhor oração de Advento é a participação na
Santa Missa, acompanhando a liturgia de um tempo rico do mistério de
Deus. Depois, a oração em família, a Novena de Natal e a oração com a
Bíblia, na leitura orante da Palavra de Deus.
Quem espera em Deus e tudo espera dele vive desde já o objeto de sua esperança,
sendo fiel e responsável diante dos apelos do próprio Senhor. Como as
gerações que precederam a vinda do Salvador viveram como se estivessem
vendo o invisível, os cristãos de nosso tempo não podem deixar para
amanhã o bem a ser feito. Sua fidelidade a Deus se manifesta na vivência da caridade,
a experiência da partilha dos bens espirituais e materiais. É o sentido
dos muitos gestos de "Natal sem fome" ou, entre nós, "Belém, a casa do
pão", assim como a grande "Coleta para a Evangelização", que se realiza
em todo o Brasil neste fim de semana. É tempo de contagiar a todos, para
que a generosidade seja experimentada e permaneça no ano que vai
começar. É um grande laboratório de caridade, com o qual vale a pena se
comprometer.
É quem começou tudo foi o próprio Deus. O Natal é a suprema epifania
daquele que a Escritura chama de filantropia de Deus, seu amor pelos
homens: "Manifestou-se a bondade de Deus e seu amor pelos homens" (Tt 3,
4). Só depois de ter contemplado a "boa vontade" de Deus para conosco
podemos ocupar-nos também da "boa vontade" dos homens, de nossa resposta
ao mistério do Natal. Imitar o mistério que celebramos significa
abandonar todo pensamento de fazer justiça sozinhos, toda lembrança de
ofensas recebidas, suprimir do coração todo ressentimento com respeito a
todos. Não admitir voluntariamente nenhum pensamento hostil contra
ninguém; nem contra os próximos nem contra os distantes, nem contra os
fracos ou contra os fortes, nem contra os pequenos nem os grandes da
terra, nem contra criatura alguma que existe no mundo. E isso para
honrar o Natal do Senhor, porque Deus não guardou rancor, não olhou a
ofensa recebida, não esperou que outro desse o primeiro passo até Ele.
Se isso não é possível sempre, durante todo o ano, pelo menos o façamos
no tempo do Advento e do Natal. Assim o Natal que se aproxima será
realmente a festa da bondade, da filantropia de Deus(Cf. Padre Raniero Cantalamessa, OFM Cap. – pregador da Casa Pontifícia, 24 de dezembro de 2007).
Para assim viver o Advento e o Natal que se aproxima, ressoa no Advento o convite de São João Batista à conversão, mudança de mentalidade, que pode traduzir-se numa corajosa revisão de vida, para arrumar a casa do coração e a busca do Sacramento da Penitência.
Enfim, a Igreja em tempo de Advento convida os cristãos ao otimismo da fé, que se traduz na virtude da alegria, fruto da presença do Espírito Santo em nossos corações.
Vem de Deus a graça que precisamos. Por isso pedimos confiantes: "Ó
Deus e bondade, que vedes o vosso povo esperando fervoroso o natal do
Senhor, dai chegarmos às alegrias da salvação e celebrá-las com intenso
júbilo na solene liturgia. Amém".
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém do Pará
Assessor Eclesiástico da RCCBRASIL
Fonte: http://www.rccbrasil.org.br/espiritualidade-e-formacao/index.php/artigos/1093-a-igreja-em-estado-de-advento
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